segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Cacos de Vidro.

Eu não suporto a incerteza, a dúvida do possível e do impossível. O presente incerto, o passado mentiroso, o futuro se desfazendo. Eu não suporto a dúvida. Se vamos ficar juntos, se vamos nos separar. Se você me ama, se você me quer bem. Se sente minha falta, se tem vontade de ficar comigo, se sente medo de me perder, se pensa em mim quando vai dormir e quando acorda de manhã, se se pega olhando para o nada imaginando meu sorriso e meu beijo molhado no canto da sua boca. Eu não suporto a insegurança. Se você ainda vai me amar amanhã, se me amou ontem, se algum dia me amou. Se ainda faz planos, se me ve acordando ao seu lado todos os dias para os restos deles, se ainda imagina o rosto de nossa filha ou planeja nossa viagem para Disney. Eu não suporto o passado. E a falta de reportagens de jornal recortadas em forma de plano de futuro, os desenhos rabiscados de meu rosto nos seus cadernos velhos, as ligações na madrugada só pela saudade de uma voz que logo estará ali. Os ursos, as cartas, as músicas. Eu não suporto o medo. Medo de que tudo tenha se acabado, medo de ser mentira ou de não ser mais verdade, medo da distância. Medo de viver uma realidade que não existe e que meus sonhos tornem-se pesadelos dos quais eu não poderei acordar. Eu não suporto amar você. O amor é o sentimento mais traiçoeiro, que me deu tudo e não deixou nada. Se eu nunca tivesse te amado não haveria pelo que sentir saudade, não haveria lembranças a se recordar, nem planos, nem pretérito, nem futuro e nem presente. Se eu nunca tivesse te amado agora eu estaria em outro lugar, com outras pessoas, vivendo uma outra vida. Talvez amando outro alguém, deitada na cama de casal do apartamento dele e não do seu. Ah se eu não tivesse te amado... com todo meu coração e com todo meu ser. Se não tivesse corrido para te encontrar em cada vez que você voltava, ou guardado cada um dos presentes e cartões para reler ao som do silêncio que você sempre deixa quando se vai. Se não tivesse dormido em seus braços, provado seu gosto e vivido seus gostos. Se eu não tivesse viajado ao seu lado, conhecido novos lugares, jantado a luz de velas, te ajudado a escolher roupas, te levado em lugares chatos e legais. Se eu não tivesse sido a primeira a andar no seu primeiro carro, se não tivesse te apresentado meus amigos e conhecido os seus, se não tivesse te incentivado a procurar um emprego melhor. Ah se eu não tivesse feito nada disso. Eu não teria inspiração para escrever. Eu não teria vivido as páginas do meu romance. Eu não teria vivido. E a sua ausência nunca seria sentida, sua presença nunca seria notada. E as lágrimas seriam por motivos diferentes. E os medos seriam por motivos diferentes. Se eu não tivesse te amado eu não seria eu mesma, seria alguém longe dos meus sentimentos e pensamentos. Não sei se seria uma estrela de Hollywood, uma dentista no sul do país ou uma psicóloga em Minas Gerais. Não sei se seria melhor do que sou, mais feliz do que sou, mais triste do que sou, mais eu do que sou. Eu jamais teria caminhado nas praças de uma cidade, pela noite fria dos meses de inverno. Jamais teria entendido como é se sentir completa, plena, infinita. Se eu não tivesse te amado eu jamais teria sido infinita e eu se disso porque só você me faz infinita, só o som da tua voz, seus olhos multicores, seu cheiro adocicado e suas reflexões sobre a vida, sobre a morte, sobre nós. Se nunca tivesse havido o "nós" eu preferiria que não houvesse o eu.

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